Igreja sem partido? Que história é essa?

 

Há uma visível pressão no interior de igrejas evangélicas para que a posição da direita evangélica se imponha na marra aos fiéis. Com ou sem a anuência dos pastores. Se estes resistem, sofrem pressões e chantagens de superiores e colegas. A disputa ideológica está acirrada entre os evangélicos ao contrário do que soam os números das intenções de voto presidencial para alguns leitores e analistas, que acreditam na maioria como a mensagem final dos números.
Neste cenário, a preocupação de recuperar a velha e esquecida mensagem do protestantismo histórico - de defesa intransigente da laicidade do Estado e da liberdade religiosa (não a liberdade de gritar suas verdades e mentiras sem consequências, mas a liberdade religiosa que assume abertamente a pluralidade religiosa) - tem se confundido com uma dúbia promoção do apoliticismo. Ou quiçá da recusa da política como parte integrante do testemunho e da ética protestante e, em geral, cristã.
Há um grupo propondo uma "igreja sem partido", a partir do diagnóstico desse clima de pressão ideológica e partidária sobre pastores e comunidades locais, para que assumam uma e única posição política e coloquem a igreja a reboque de uma candidatura. Não está claro a quem se combate, mas é provável que seja a direita evangélica bolsonarista, porque é ela que está promovendo uma descarada constantinização da igreja, com decisões que violam a liberdade religiosa e os direitos constitucionais dos próprios crentes a terem várias posições políticas sem que isso ameace necessariamente sua fé. Para a direita evangélica, o pacote tem que ser inteiro: conservadorismo bíblico, moral, político, ideológico, econômico, social, cultural. Nada menos é aceitável.
Acho muito problemático este movimento. Primeiro, porque assume acriticamente a lógica de um pernicioso movimento surgido na educação em 2016, sob direta influência e direção da direita - evangélica, católica, secular - para coibir o pensamento crítico, perseguir professores, impor uma pauta educacional "cívico-militar", questionar o debate sobre gênero e diversidade sexual, atacar o fantasma do "comunismo", negar a pluralidade etnica e cultural da sociedade. Segundo, porque os evangélicos progressistas não querem que a politica deixe de ser discutida na igreja. Querem apenas que a instituição não seja arrastada para apoiar ideologias e governos específicos, violando a pluralidade que deve existir ali. O slogan de "igreja sem partido" é antipolitico e prolonga a influência da direita no já conturbado meio evangélico. Acho que devemos desautorizar esse movimento e não promové-lo. Se possível, dialogar com seus proponentes, para mostrar o equívoco deles, se for uma iniciativa bem intencionada, mas pouco refletida em suas consequências. Mas se os proponentes forem apenas mais um grupo de conservadores nâo-bolsonaristas, que querem mesmo é "sanitizar" o discurso evangélico e reconstruir um ambiente de igreja sem ética, só com "espiritualidade", sua proposta é equivocada e contraproducente. Estimulará rejeição da política e não proteção dos pastores que estão sofrendo com as imposições da direita.

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